terça-feira, 18 de março de 2008

EXPERIÊNCIAS ELEITORAIS

O Ilton Dellandréa é um desembargador aposentado que mantém um blog, o Jus Sperniandi (dellandrea.zip.net), onde, de vez em quando, fala sobre a Justiça Eleitoral e, principalmente, sobre a urna eleitoral.

Ele comenta com a visão crítica de quem já foi juiz. Na semana passada, publicou um artigo arrasador sobre essa história de, vez por outra, fazer recadastramento. Trechos:
“Lembram do famoso recadastramento eleitoral de 1986? Eu era Juiz Eleitoral em Novo Hamburgo e presidi aquela experimentação. (...)

Fui contra o recadastramento daquela forma porque era fácil prever que ele serviria para muita coisa, menos para evitar fraudes em eleições, seu objetivo principal. Foram jogados no lixo da história eleitoral títulos de eleitor antigos e folhas de votação nos quais constavam, necessariamente, fotos do eleitor e sua qualificação. Este material era suficiente ao recadastramento, sem obrigar o eleitor a comparecer ao cartório para fazer novos títulos. Estes poderiam ser confeccionados com os dados existentes e entregues no dia das eleições... Então surgiriam as duplicidades de inscrição automaticamente e caberiam as providências contra os eleitores de má fé. Mas, como sempre, a ineficiência do Estado é jogada nas costas do povo, no caso, dos aptos a votar.

Falava-se em eleitores fantasmas. Falava-se em inscrições duplicadas. O recadastramento enterrou os vestígios dos crimes de uns e de outras. A Justiça Eleitoral ressurgiu livre e incólume, pois resolveu um impasse: extinguiu o corpo do delito do crime e este deixou de existir magicamente. Algo assim como sumir com o cadáver num homicídio.”
Depois de mergulhar um pouco mais nesse pântano, o Ilton levanta uma questão que, no blog dele, é recorrente, a da segurança do voto:
“A Justiça Eleitoral, além de experimental, é asséptica e pura como uma vestal romana. Sai desses episódios sem mácula nem meas culpas. Como nas eleições: contados os votos, proclamados os resultados — e isto se faz com a insegurança da celeridade que impressiona em detrimento da segurança dos resultados corretos — pode haver delitos, pode haver vítimas, mas não haverá culpados.

Agora, ainda no campo da experimentação, está iniciando um novo recadastramento. Serão usadas as digitais do eleitor e seus títulos serão ilustrados com fotos numa nova urna eletrônica modernizada. Mas, de novo, não vejo preocupação com a segurança do voto, quero dizer, da destinação do voto.”
Em ano eleitoral, esta é uma questão que deveria preocupar-nos a todos.

4 comentários:

Anônimo disse...

Pois é. O assunto está repercutindo internacionalmente. Um membro do Fórum do Voto Seguro, senhor Jura Passos, repassou meus posts ao estudante de Direito Aaaron Lorber, da NOrthwestern University de Chicago que, juntamente com um grupo de colegas, está estudando o sistema brasileiro de votação. Eles acharam “muito interessante” a minha abordagem, estarão no Brasil na próxima semana, e trocaremos impressões a respeito. Um abraço e obrigado pela força.

Anônimo disse...

Cesar e Ilton,
o mundo acadêmico da informática é quase unânime sobre os problemas de (in)segurança relacionados às urnas eleitorais eletrônicas, que podem dar lugar a fraudes antes impossíveis e até inimagináveis.

Mas o judiciário eleitoral faz de conta que não é com ele e dá de ombros em relação às denúncias de inúmeras falhas e fragilidades do projeto e dos processos eleitorais baseados nessas maquinetas.

Uma excelente referência é o prof. Pedro Rezende, da UnB, que desde o milênio passado vocifera contra as urnas eletrônicas da forma como estão. Sua página tem um incontável número de artigos e entrevistas concedidas sobre a insegurança inata das urnas eletrônicas: http://www.cic.unb.br/~pedro/sdtp.html#Urna-e
Ele é prolixo, mas para ser preciso; e escreve de forma a ser compreendido não só pelo pessoal de informática, mas também pelo público em geral.

Anônimo disse...

Cesar, parabéns pela iniciativa de trazer as luzes do Dr. Ilton Dellandréa sobre esse assunto. Agora que o pessoal do governo está lendo o teu Blog aproveitam e se instruem um pouco...he he he..

Anônimo disse...

César e, por extensão, Dr. Ilton: Parabéns por mexer nesse vespeiro. Também desconfio, há muito, do sistema eleitoral eletrônico. Só para constar: numa bela cidade deste nosso Estado, o prefeito é "imbatível" em termos eleitorais, e não existe oposição na Câmara (nenhum vereador de oposição se elegeu). Coincidentemente, é muito amigo de uma personalidade do Judiciário (que já trabalhou naquela cidade) e que tem muito a ver com a história da urna eletrônica. Não entendo porque não foi mantida a exigência (que constava de uma lei) de que todas as urnas deveriam ter uma impressora acoplada, que depositaria os votos numa urna de plástico e, em cada Zona eleitoral, seriam objeto de contagem por sorteio e amostragem.