quinta-feira, 24 de abril de 2008

A CONFUSÃO ENTRE PUBLICIDADE E PROPAGANDA

Lá no seu art. 37, a Constituição manda que os poderes públicos dêem publicidade de seus atos. Muito prefeito, governador e presidente interpreta essa determinação como um apelo a que façam propaganda de seus feitos. Até que, à primeira vista, a diferença parece sutil. Mas não é.

Interessa aos espertos que exista essa confusão e que pareça mesmo uma coisa irrelevante. Mas não interessa pra nós, que acabamos pagando, com nossos impostos, a criação da imagem pública de vários políticos. E mesmo quando o dinheiro envolvido não é nosso, a confusão não nos interessa porque, de uma forma ou de outra, acabamos fazendo papel de bobos. Ou vocês não se sentem mal quando descobrem, só depois da eleição, que aquela coca era fanta?

Que me corrijam os ministros do TSE, que são especialistas em Constituição, se o que eu disser a seguir estiver errado. Mas a publicidade dos atos de governo tem a ver com o relato (ou com a exposição) do que está sendo feito com o mandato. Em algum lugar de fácil acesso o cidadão deveria encontrar os detalhes de cada ato de governo. Quanto custou, quem fez, quem ganhou, quem pagou, quanto tempo levou, que materiais foram usados.

Coisas que estão, por exemplo, no Portal Transparência do governo federal. Em algumas páginas do site da secretaria estadual da Fazenda. No Diário Oficial. E assim por diante. Não pode ter nada secreto quando se trata de dinheiro público (tá, tem a discussão sobre segurança nacional e segurança do presidente, mas vamos deixar isso de lado, por enquanto).

Coisa muito diferente, mas muito diferente mesmo, é a propaganda que os governos fazem de seus (bem) feitos. Tanto que os tribunais têm acatado a argumentação dos que reclamam do uso ilegal dos meios de comunicação, da propaganda fora de época, do abuso do poder econômico relacionado com a comunicação.

E um leitor, fanzoca do prefeito Darío, mandou a seguinte cartinha, a propósito da notícia que o PP e o DEM-o vão cobrar na Justiça a propaganda que o alcaide tem feito. Prestem atenção, porque dá pra ver a forma como ele entende este problema:
“Bem que o PP poderia pensar em lançar um candidato e disputar uma eleição de peito aberto.

Tá mais do que na hora de compararmos as realizações dos últimos anos na administração da cidade.

Agora só querem ganhar no tapetão?

A propósito, basta ver, propaganda da prefeitura não tem nada de mais, nem de pessoal, é apenas prestação de contas.

Eleição se decide no voto, mas como o Amin perdeu as 2 últimas...”
Estão claras aí duas coisas que sempre aparecem quando se discute publicidade e propaganda governamental:

1. Todo questionamento é visto como tentativa de obter, por “meios ilícitos”, o que não conseguiram pelo voto. Ora, se houve descumprimento da lei, o ilícito está em quem a descumpriu, não em quem levou à Justiça o caso. E recorrer à Justiça não é ilegal. Quando o for, os juízes tratarão de recusar a demanda e até poderão punir o autor, se for o caso de alguma “litigância de má fé”.

2. A propaganda “não tem nada demais”. Foi bem feitinha, por uma agência conceituada, é pura “prestação de contas”... Ora, se usa aquelas técnicas da propaganda (tipo “sua vida está melhor” ou “a cidade está mais feliz”), deixa de ser inocente. Passa a ser promoção, construção de imagem... propaganda.

Interessante observar que, se é o meu candidato que está na prefeitura ou no governo, toda tentativa de fazer respeitar a lei (ou interpretá-la sem tanta flexibilidade) é “coisa da oposição raivinha que quer terceiro turno”. Afinal, são todos corretos, bem intencionados, fazem o bem à comunidade com sacrifícios pessoais tremendos e parece que ninguém reconhece.

E quando é um desafeto que está no poder, a coisa muda. A fiscalização passa a ser um ato de cidadania.

Para resolver esses conflitos é que precisamos dos tribunais. Sempre que houver um impasse, eles precisam nos dizer (passando, se posível, ao largo das paixões partidárias), se a lei foi obedecida ou violada.

A lei, tal como o sol, nasce para todos. LHS, Darío, Esperidião, Ângela, não faz a menor diferença: se pisou na bola, precisa se explicar. É assim que a democracia se aperfeiçoa.

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PS: como sou um sujeito inventador de moda, diagramei esta nota, no jornal (DIARINHO, lembram?) com grandes capitulares. Aqui no blog, onde o texto tem uma coluna só, foi impossível obter o mesmo efeito. Por isso reproduzo, abaixo, como ficou no jornal. ;-)

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