A falsa questão do diploma
Por José Milton Santos*
Periodicamente, a regulamentação da profissão de jornalista é questionada, seja através da própria imprensa, seja através de ações na Justiça. É bom lembrar que, embora a luta pela regulamentação remonte ao início do século passado, o movimento efetivo que logrou resultado articulou-se a partir de Minas Gerais na década de 1960.*Jornalista, professor e diretor de Relações Institucionais do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais. Texto publicado no site da Fenaj.
Há vinte anos, uma assembléia do sindicato mineiro aprovou o documento intitulado “A regulamentação profissional do jornalista e a liberdade de imprensa”, com a participação de profissionais de veículos, professores e estudantes dos três cursos de Jornalismo então existentes no estado, do qual reproduzimos as partes mais importantes:
“Os jornalistas profissionais de Belo Horizonte, professores e estudantes dos cursos de comunicação do estado, representados por suas lideranças, reiteram nesta Assembléia sua posição em defesa da mais importante conquista da categoria, fruto de anos de luta das mais autênticas lideranças da classe: a regulamentação do exercício da profissão.
Liberdade de expressão
Dizem os defensores da ‘desregulamentação’ da profissão – pois é isto que está em pauta atrás da extinção da obrigatoriedade do diploma para o exercício profissional do jornalismo – que o atual sistema de acesso à profissão é antidemocrático e cerceador da liberdade de expressão.
Hoje o critério (para admissão) é competência comprovada num mercado altamente competitivo. O que assegura ao profissional o acesso à carreira e a sua permanência no mercado é exatamente o que faz o sucesso ou o fracasso de outros profissionais de qualquer categoria: seu talento e competência no trabalho.
Por outro lado, a liberdade de expressão, em momento algum é atingida pela regulamentação, dada a própria característica básica da profissão: jornalista é um processador do pensamento alheio, das diferentes correntes e lideranças da sociedade; é um mediador, um facilitador da compreensão da mensagem, um servidor fiel da liberdade de expressão, na medida em que é o seu trabalho que favorece e estimula o diálogo no nível das diferentes comunidades.
Aperfeiçoamento e retrocesso
Estamos convictos – e esta é uma posição compartilhada por jornalistas de todo o mundo – de que a informação é um bem público de fundamental importância para o crescimento da sociedade e que os profissionais que nela atuam devem ser mais que bons redatores e talentosos utilizadores de linguagens. Estes profissionais devem ter uma preparação universitária capaz de levá-los a superar a aparência dos fatos que divulgam e analisam, de modo a apresentar aos leitores um conhecimento mais pleno daquilo que acontece em nosso meio.
Só o despertar intelectual adquirido nas universidades e prolongado e aprofundado na vivência profissional permite ao jornalista captar a realidade subjacente aos fatos e elaborar notícias que não escondam ângulos (econômicos, políticos, psicológicos etc.) perceptíveis apenas àqueles que se preocupam com as causas de tudo que acontece.
A própria evolução tecnológica dos meios de comunicação e as imensas transformações sociais, políticas e econômicas por que passou o país revelam a necessidade de melhor formação dos profissionais da área. No momento em que as empresas jornalísticas buscam continuamente seu aperfeiçoamento tecnológico atualizando seus parques gráficos e equipamentos de produção da informação é, no mínimo, muito estranho que elas mesmas venham à luta na tele-radiodifusão em prol do direito de contar com profissionais menos qualificados.
Riscos no precedente
O que se deseja, na verdade, com a ‘desregulamentação’ do exercício do jornalismo é enfraquecer a luta conjunta dos profissionais que recentemente conseguiram ter sua profissão – após longos anos de dedicação e trabalho – reconhecida e regulamentada por lei.
Trata-se de uma estratégia mais ampla dos patrões, além de criar perigoso precedente para outras categorias, que visa a dificultar a regulamentação das novas profissões que vão surgindo e que, desse reconhecimento, possam melhorar sua luta por condições satisfatórias de trabalho e salário.
A regulamentação é uma conquista dos trabalhadores jornalistas. Consideramos qualquer ameaça a esta posição um grave retrocesso e alertamos os companheiros de outras categorias profissionais para os riscos embutidos no precedente que seria aberto.”
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