quinta-feira, 18 de setembro de 2008

CARTA DE UM PAI AOS CANDIDATOS

O DIARINHO publica hoje uma longa carta, que ocupa quase dois terços da página do jornal, onde um pai dirige um apelo desesperado aos candidatos a prefeito. Trouxe-a para cá, apesar de extensa, porque é leitura obrigatória. E serve para candidatos de qualquer cidade. Emocionante, emocionada, a carta revela um mundo que muitas vezes tentamos varrer para debaixo do tapete. Façam, a si mesmos, o favor de ler e pensar sobre o que está dito a seguir:

“Senhores candidatos a
prefeito de Itajaí, socorro!

Acabem com esta corja de traficante que está assolando nossa cidade e transformando nossos filhos em mortos-vivos.

Me escutem: sou pai de uma jovem viciada em crack. Luto desenfreadamente há 5 anos, e venho observando que minha luta é inglória porque:

1. Minha filha conheceu as drogas dentro da escola, aos 12 anos.

Todas as escolas possuem alunos que vendem drogas em seu interior e os malandros que ficam em volta dos estabelecimentos na hora da entrada e da saída; toda a direção e todo o corpo docente tem conhecimento mas pouco podem fazer porque os alunos são "mais espertos", dissimulados e não se pode fiscalizar as mochilas, para não ferir a "privacidade".

2. Minha filha rapidamente avançou para o crack, para a escória, para a lama, para o roubo, para a violência, para as “bocas de drogas”.

Este avanço é apavorante, choca a todos que estavam acostumados a vê-Ia como uma menina educada, capaz, religiosa, interessada nos estudos, cheia de planos para o futuro.

Foi criada numa família cujo vinculo amoroso é impecável, ela era uma criança muito alegre, espirituosa, criativa e dócil, mas sua curiosidade e ousaria a fizeram prisioneira desse submundo. Familiares, amigos e vizinhos não conseguem acreditar nessa transformação tão violenta. Suas referências e seus vínculos hoje são outros.

Agora com 17 anos e sempre com vários e diferenciados tratamentos, tanto ambulatoriais, internações psiquiátricas, comunidades terapêuticas e outros alternativos, tomando muitos medicamentos para ansiedade, distúrbio de humor e outros para amenizar a "fissura", minha filha está com a saúde debilitada. Seu pulmão e coração estão afetados pelo uso das drogas, seu cérebro danificado sensivelmente, não mais estuda, não leva uma vida normal como toda adolescente, pois vive sob constante vigilância e uso de medicamentos, sofrendo ainda assim, freqüentes recaídas. Minha filha está triste, sem sonhos, e ainda nos iludimos que a cada recaída seja esta a última vez, que tudo vai mudar... mas não é assim.

O domínio da droga é maior do que o desejo pela vida, pela saúde.

Minha vida, da minha esposa, dela mesma e de toda a nossa família gira em torno da droga. Ela (a droga) nos domina, convive conosco, somos uma família adoecida, falida.

Passamos por todas as fases de sofrimento. Estamos sempre na luta, não podemos desistir desse ser tão amado que colocamos no mundo. Estamos destruídos, mas nosso amor ainda é maior, entretanto.

Vejo que apesar de tanta luta minha e de milhares de outros pais, que vivenciam esta triste caminhada, nossos filhos continuam à mercê desses criminosos traficantes, que se fazem presentes em todos os bairros de nossa cidade, em nosso país, fazendo desses menores uns viciados, uns aviõezinhos, uns ladrõezinhos, transformando nossos futuros cidadãos em mendigos e bandidos, em tão tenra idade.

Senhores: Devem estar se perguntando o por quê dessa história tão comum estar sendo dirigida aos senhores. Sei que talvez muitos estejam pensando: por que este cara não educou melhor a sua filha? Não a preparou para este mundo, para esta nossa realidade? O que temos a ver com o problema particular deste indivíduo? O que o governo tem a ver com isto?

Mas tem sim, e muito. Limpamos a nossa casa diariamente, mas mesmo assim, de vez em quando aparecem alguns insetos, alguns ratos. Se deixarmos acumular a sujeira, então, estes bichos, com certeza, tomarão conta do nosso lar, passarão a ser os anfitriões de nossa casa.

É o que está acontecendo em nossa cidade. Os traficantes estão tomando conta de nossas ruas e entrando em nossos lares através de nossos filhos, estamos reféns e sujeitos a qualquer desgraça. Pensem bem: hoje quase não se vê uma pessoa que não tenha um parente ou um amigo em igual condição, isto é, com alguém envolvido com as drogas bem próximos a nós.

Vivemos uma verdadeira epidemia, no mundo das drogas.

Senhores candidatos: olhem, vocês não são meros espectadores dessa desgraça, não fiquem alheios a esse sofrimento. Algum de vocês já ouviu falar, outros já presenciaram, enfim, de certa forma há algum conhecimento.

Está demais esta situação em nossa cidade.

Aí irão dizer: mas nas outras também! Mas moramos aqui, aqui é o nosso lar e não podemos nos conformar com isso. Todos nós sabemos onde estão os pontos de venda de drogas; a polícia também sabe, a justiça também, todas as autoridades e, infelizmente, nossas crianças e jovens também. Não adianta enfeitar os jardins, as praças, receber transatlântico, criar espaços para festas. Nossa cidade está suja, doente, é uma moléstia que tem nome, endereço conhecido, mas ninguém consegue erradicar. Aliás, tem alguns candidatos que estão com seus nomes e rostos estampados em várias casas de traficantes. Que pena, provavelmente desconhecem.

Senhores candidatos a prefeito: um dos senhores será o dono da cidade, será aquele que dá as ordens.

Por favor, junto com seus vereadores eleitos, e todos de mãos dadas, independentemente das coligações partidárias, acionem o Conselho Tutelar, a Secretaria da Criança e do Adolescente, a Secretaria de Segurança, Secretaria de Justiça, agreguem o Fórum, a Polícia Civil, a Polícia Militar, façam um mutirão pela vida de nossos filhos, usem a mesma linguagem.

Retirem das ruas estas crianças que andam perambulando, sem documentos numa correria medonha, a noite toda na venda e no consumo de drogas.

Antigamente, não tínhamos esta malandragem nas ruas e havia uma maior fiscalização; hoje, com tanta coisa ruim acontecendo, parece que nada se faz, e nossa cidade está cheia de andarilhos pelas noites e nós nos tornamos reféns, acuados, estamos todos os dias correndo riscos em nossas casas, em nossos estabelecimentos comerciais, em nossos escritórios, enfim, nos sentindo sós, sem autoridade, nesta terra tão linda, porém que a cada dia se torna tão perigosa. Depois que esta imensidade de traficantes cresce a cada dia a olhos vistos, pouco adiantam as entidades para tratamentos, porque esta droga terrível vence a todos. Quando nossos filhos "caem", às vezes nos culpamos, mas não é assim

A situação é mais complicada do que parece. Não adianta ser bem nascido, educado, orientado, se vivemos numa cidade sob o domínio das drogas.

Nossos filhos não podem ficar presos em casa, mas todos lugares de divertimento em nossa cidade são invadidos por marginais misturados ao povo, para o nosso desespero, onde de tudo se vê, dentro e fora dos mais variados estabelecimentos: assaltos, violência, tráfico, junto às famílias que lá estão para se divertirem. Senhor futuro prefeito: Diga o senhor "NÃO ÀS DROGAS" em nossa cidade.

Expulse daqui esses elementos que estão transformando nossos jovens em mortos-vivos, trazendo desgraça a tantas famílias.

Quantos estão internados nas mais diversas instituições, ou se tomando debilóides, completamente destruídos; quantos já partiram para o crime, pois precisam roubar para manter o vício; quantos já morreram de overdose, ou por um acerto de contas; quantas famílias já faliram de tanto gasto com tratamentos em vão; quantos pais se encontram profundamente deprimidos ao verem seus filhos de joelhos diante de uma pedra maldita como o crack, em vez de estarem usufruindo o lado bom da vida. Porque droga é destruição.

E essa destruição já passou do lar do vizinho, está no nosso. Precisamos de autoridades, de vigilância, de ações imediatas, precisamos banir de nosso convívio esses meliantes, esses aliciadores, que não se importam com a dor alheia, pois nesse mundo em que vivem só há lugar para o comércio dessa porcaria. Eles também já foram vitimas quando crianças ou adolescentes, já fizeram e ainda fazem suas famílias sofrerem, e o que é pior, fazem escola, pois muitos de nossos filhos começam admirando a vida perigosa desses traficantes e acabam se tomando um deles.

Senhor candidato: veja em cada munícipe menor de idade um filho seu e faça pelo mesmo o que você faria por seu filho; não deixe acontecer com ele o que você não quer que aconteça com seu filho, com seu neto...

Senhores: perdoem o meu lamento. É a dor de um pai que vive sob ameaça de traficante, que vê sua filha sem forças e todos os tratamentos sem sucesso

Não quero esse sofrimento para outros, por isso os estou alertando, suplicando: façam alguma coisa urgente!

Lembre-se: um de vocês será o dono dessa casa, desse quintal, não deixem esses ratos entrarem, pensem em exterminá-los antes que seja tarde, antes que eles passem a ser o dono, não só da área, mas de tudo e de todos.

Dêem o exemplo. Vejam que o abandono está tomando conta até do centro de nossa cidade Até prédios públicos centrais estão servindo de dormitórios de malacos, onde tudo destroem.

Deixem marcas boas. Digam não ao comodismo, ao medo de agir Quando votamos, elegemos um representante. Não sejam representantes do nosso luto. Defendam-nos. Crianças mortas são votos perdidos. Adolescentes incapazes, também, além do mais, oneram a saúde pública

Peço a vocês, em nome do nosso povo sofrido. E conclamo ao povo, que vote naquele que apresentar a melhor estratégia para livrar a nossa cidade dessa epidemia. Que Deus ilumine os seus pensamentos e guie as suas ações.

De um pai, que provavelmente não terá outra geração, mas que reza para que outras famílias as tenha. Com saúde e paz.”

Ass.: José, pai de uma vítima das drogas (Transcrito Ipsis Littteris)

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