quarta-feira, 17 de outubro de 2007

ASSÉDIO JUDICIAL CONTRA JORNALISTAS

O presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Sérgio Murillo de Andrade, que é catarinense e leitor do DIARINHO, mandou uma cartinha ontem cedo, a respeito da nota que publiquei sobre a tal ONG Artigo 19:
“Em março de 2005 a Consultor Jurídico publicou o artigo abaixo, republicado dias depois no site da FENAJ. Em várias oportunidades, usando os mesmos dados e citando a fonte, denunciamos um quadro que configura, no Brasil, processo de assédio Judicial contra os jornalistas. Ninguém deu bola. Daí vem uma ong estrangeira requenta os mesmos números e denúncias, mais de dois anos depois, e vira notícia em todos os jornalões, inclusive no Diarinho.

Durma-se com um barulho desses.”
O artigo ao qual o Sérgio se refere, que contém os dados que agora, porque vieram de fonte estrangeira, todo mundo repercutiu, passou “despercebido”, a meu ver, porque tocava num ponto que foi demonizado pelas empresas jornalísticas e por muitos jornalistas: o Conselho Federal dos Jornalistas.

A lembrança do Sérgio, portanto, é útil não só porque nos permite continuar falando no problema dos processos a rodo contra jornais e jornalistas, como também voltar à vaca fria: por que todas as categorias podem ter um Conselho Federal, que defenda o exercício profissional, e os jornalistas não?

Jornalistas querem reagir contra sua banda podre
por Márcio Chaer*
“Réu em múltiplos processos por crimes contra a honra, o comentarista esportivo Jorge Kajuru foi condenado, na semana passada, por difamação, a 18 meses de detenção, em regime aberto, na Casa do Albergado de Goiânia. O processo foi aberto pela filial da Rede Globo em Goiás, onde a emissora é tocada pela Organização Jayme Câmara. Kajuru, cujo nome é Jorge Reis da Costa, responde por, pelo menos, mais 108 processos por dano moral.

Por ser definitiva, na área criminal, a decisão é incomum. Por ter sido movida por empresa jornalí­stica, é emblemática. A condenação acontece em um contexto pouco favorável para a imprensa em geral e especialmente ruim para os jornalistas. Levantamento feito por este site, há pouco mais de um ano, mostra que para um universo de 2.783 jornalistas de 5 grupos jornalí­sticos havia 3.342 ações judiciais por dano moral.

O estudo mostra que a imprensa foi engolfada pelo alto grau de litigiosidade que vigora em todos os setores do paí­s, o que se constata pelo entupimento do sistema judicial. Mas mostra outras duas vertentes tí­picas do setor: uma é o assédio judicial movido por polí­ticos, empresários, juí­zes e outros segmentos que usam o Judiciário para que suas mazelas fiquem em segredo.

O outro vetor é o segmento de empresas e profissionais que usam o jornalismo para fazer negócios: suprimem ou dão notí­cias em troca de dinheiro, publicidade ou favores. É esse setor que contamina a imagem de toda a imprensa, contribuindo para a multiplicação de processos e condenações.

Caso concreto

Um caso acabado de extorsão é descrito em detalhes nos autos de processo (000.02.226954-1) julgado pela 2º Vara Cí­vel Central de São Paulo. Enquanto um empresário e sua empresa eram alvejados por notas consideradas mentirosas e ofensivas de um colunista, as ví­timas foram procuradas por uma ONG do próprio jornalista para comparecer com uma “doação” de 30 mil reais. Sem a doação, os ataques recrudesceram.

A ONG em questão é uma entidade assistencial chamada Projeto Down, alegadamente voltada para o apoio a crianças acometidas da sí­ndrome. A entidade tem o mesmo endereço da empresa jornalí­stica e o site do colunista direciona os leitores para o projeto down.

Gilberto Luiz di Pierro, que atende pelo pseudônimo de “Giba Um”, e sua empresa, a Manager Comunicação, foram condenados pelo juiz José Tadeu Picolo Zanoni a pagar 1.000 salários mí­nimos como reparação.

Em sua sentença, o juiz anota que o pedido de dinheiro “foi claramente confessado”. A coincidência de o endereço do recibo da ONG ser o mesmo da Manager, afirma Picolo Zanoni “derruba toda a argumentação dos requeridos em prol do trabalho social que eles acreditam desenvolver”.

O colunista Giba Um, em primeira instância, já foi condenado e recorre contra outras decisões que lhe impuseram as penas de três meses de detenção, uma reparação de 20 salários mí­nimos e outra de 500 salários. Outros processos estão em curso, como o da filha do presidente Lula, Lurian, e do prefeito de Blumenau. Ambos pedem reparação de 1.000 salários mí­nimos. Todos os casos envolvem crime contra a honra.

Reação de classe

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) reuniu-se neste final de semana para discutir suas diretrizes para 2005. Na pauta, uma campanha de revalorização profissional. O vice-presidente da Federação, Fred Ghedini, que também dirige o sindicato dos jornalistas de São Paulo, concorda que para recuperar o respeito da sociedade e do Judiciário a corporação deve reagir contra quem usa o jornalismo para atos de banditismo.

“Por isso vamos retomar a luta pela criação do Conselho Federal dos Jornalistas”, afirma Ghedini. O Conselho teria instrumentos disciplinares mais efetivos que as comissões de ética da Fenaj e dos sindicatos. Segundo o dirigente, “uma ação mais firme no âmbito profissional traria um ganho de qualidade nessas questões”, que hoje são arbitradas de forma descompensada pela magistratura.

O CFJ foi repelido no ano passado pelas empresas jornalí­sticas por ser visto como um possí­vel órgão de controle da imprensa. Suas caracterí­sticas de autarquia que passaria a cobrar contribuições compulsórias da categoria, dona da licenciatura para o exercí­cio da profissão, provocaram a repulsa também, da maior parte dos profissionais do ramo. A sua rejeição, contudo, não resolve o drama da falta de um órgão disciplinar. Sem um tribunal de ética, empresas e jornalistas ficam à mercê dos 15 mil juí­zes brasileiros, um colegiado majoritariamente resistente ao jornalismo que se pratica no paí­s.”
* Diretor da Revista Consultor Jurí­dico.

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