O grupo de “editores” era um time bem heterogêneo: Emanuel, Pedro Port, Raimundo Caruso, Carlos Damião e este que vos fala. Tínhamos, em comum, poucas coisas. O único consenso obtido sem discussão e sem brigas, resultou no único artigo do código de honra do Desterro. Dizia mais ou menos assim: “este jornal será diferente de tantos outros: voltado para divulgar a cultura e a literatura, não publicará textos de seus editores, não servirá aos propósitos rasteiros da auto-promoção”.
E assim foi feito. Os cinco escritores não publicaram nada deles no jornal que editavam. E que era impresso na precária gráfica de um sujeito de Itajaí que fazia um jornal muito desbocado. O Dalmo Vieira (que editava o Diarinho onde, por coincidência, fui trabalhar em 2005).
Em 1980, quando fui morar em Brasília pela primeira vez, fui vizinho do Emanuel. Saíamos cedo para correr no parque da cidade e nadar nas piscinas de água mineral. E tomávamos café da manhã lá em casa. Fui e voltei, mudei, tornei a mudar. E ele lá. Impávido. Criando raízes. Não fosse um sujeito alto e ereto, poderia ser confundido com as árvores retorcidas do cerrado. Mas os cabelos adquiriram um certo quê de folhagem seca. Quem não prestar muita atenção certamente não conseguirá separar mais o Emanuel da paisagem do planalto central.
Temos nos falado pouco e esparsamente. Coisa de uma vez por ano, se tanto. Ontem me mandou um texto sobre esta compulsão que nos une: escrever. Publico-o abaixo. Bom proveito.
POR QUE ESCREVEMOS?
Emanuel Medeiros Vieira
“Começamos escrevendo para viver e acabamos escrevendo para não morrer.
Para quem edifica palavras mal rompe a aurora, escrever é inadiável e urgente, mesmo que nada externamente nos obrigue a isso. Mas a necessidade interna é visceral, orgânica, chama e fogo, flecha, algo colado à pele.
Não conseguimos escapar desse apelo.
Escrevemos para perdurar, para vencer a poeira do tempo, para despistar a morte, para regar nossos fantasmas e (por que não?), para amar e se amado.
A literatura é o refúgio da sinceridade num mundo de pose.
“A literatura é um apelo de fogo, onde mora meu desespero, a minha inquietação e o meu paraíso”, escreveu alguém.
Eu sei: tento escrever um hino de amor à palavra.
Qual a maior viagem (interior) que podemos fazer, senão aquela que é um mergulho no livro, nesta criação de outros mundos, nessa peregrinação às áfricas interiores?
“Se o mundo dos objetos palpáveis e vida prática, não é mais real que o mundo das ficções, dos sonhos e dos labirintos, então pode ser que o autor de artifícios verbais tenha mais direito à condição de demiurgo que qualquer outro candidato”, escreveu Samuel Titan Jr., falando sobre Borges.
Hoje, a realidade chamada virtual fica sendo mais importante que o humano propriamente dito.
Uma personalidade não aparece porque é boa, mas é boa porque aparece.
Vivemos uma mudança de época e não uma época de mudanças.
Ou está inapelavelmente decretado que não há nada mais a fazer, que o destino já rabiscou todos os destinos?
Queremos um modelo de consumidores ou de cidadãos?
Aceita-se passivamente um mundo onde são as coisas que comandam e não os valores.
Queremos pessoas abúlicas, inertes, numa globalização onde impera a uniformidade e não a igualdade?
A literatura é um sonho do eterno. Sua morte tem sido decretada diariamente.
Mas por que ela continua tão viva?
Pois há dentro do homem uma sede de infinito que nenhum modelo meramente mercantil pode saciar.”
3 comentários:
Uncle Ceasere
E o velho Tio Tadeu ainda está em grande forma. Não consegue abstrair - ainda bem, talvez (? sic sic) - essa guerra ensandecida em busca do 'santo graal' do consumo que nos imbeciliza, a todos, em alguma medida!!! Convive há muito tempo lá no planalto - verdade que aos sobressaltos - com a camarilha que pra quelas bandas migra atrás de mais e mais poder. Alguns da politikalha que parecem moscas orbitando as Casas outrora vetustas, embora não menos corruptas, outros que mais parecem o próprio cocô que inebria essa camarilha que dia-adia nos assalta. Bem-vindo Tadeu pelas mãos do tio-jornalista-emprestado Cesar. Saudações, Paulão.
Ainda bem que não impera a igualdade...hehehe...
Amorim é a justificativa da própria afirmação. Portanto, tem razão! Ainda bem! Paulão
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