quinta-feira, 31 de julho de 2008

CONTO DE FADAS

Outro dia sonhei que escutava umas histórias que um empresário contava, sobre experiências nada dignificantes que teve, ao fornecer para o governo de uma província longínqua de um país distante.

A corrupção, naquela terra estranha, era muito disseminada. Nos vários níveis de governo só variavam a intensidade, a cara de pau e os valores, mas ninguém podia atirar a primeira pedra.

Pois bem, coisas do tipo: coloca R$ 300 mil a mais no preço e “paga” o “excesso” aos envolvidos no negócio. Às vezes um secretário, às vezes diretores, às vezes uma coisa etérea genericamente conhecida como “o partido”.

Licitação, pregão eletrônico, tudo dentro da lei. Mas o que é do homem está garantido. E por que os concorrentes não denunciam? Não reclamam? Ora, porque podem ficar fora de futuras compras. Ninguém quer brigar com o governo.

Ué, mas então todos sabem? E protegem quem pede a “comissão”? Claro. Negar-se a pagar significa ficar com o nome “sujo”. Vira inimigo da turma toda.

Tivesse eu estômago fraco, acho que teria vomitado quando o interlocutor começou a nominar os beneficiários de duzentinho aqui, cem ali, quarenta acolá, trezentinho mais adiante. À menção de algum nome que julgava acima de suspeitas, até perguntava, sem muito entusiasmo: “o fulano? tem certeza?” E aí, só pra que eu deixasse de ser otário, contava detalhes de operações cabulosas (“ele foi daqui, o cara veio de lá, encontraram-se no meio do caminho pra acertar os termos do negócio e aí não deu: 25% era demais”).

Não entendo como é que alguém entra num esquema desses e continua tocando sua vida pública e seus discursos “pela ética e pela moralidade” sem corar. Sem gaguejar. Sem vergonha do que faz.

Ah, e entrar no esquema é fácil. Talvez na primeira vez dê um certo nervosismo, mas os fornecedores mais experientes já estão preparados e acostumados a ouvir o pedido dos 10%, dos 15%, até mais. E prontos para atender, com naturalidade. É um negócio, com suas regras e a lealdade mafiosa que garante o sigilo.

Mas é difícil pra sair: o político certamente ficará sem recursos para disputar eleições e, ainda por cima, mal visto pelos “colegas”, não será mais chamado para cargos “de confiança”.

Putz, ainda bem que foi só um sonho!

5 comentários:

Anônimo disse...

Cesar,
Quase 100% das transações feitas com os governos - federal, estadual, minicipal - incluem algum tipo de propina ou super faturamento. Está na cultura da burocracia. E desde sempre, só que atualmente disseminou-se de tal forma que o percentual chegou ao citado acima. Os esquemas já estão armados e entra e saia governos a situação permanece. Há maracutaias em tudo no Brasil. Ontem noticiou-se o pagamento de propina aos médicos que gerenciavam a fila de transplantes de fígado. Furar a dita cuja custava até 250 mil reais. O poder no Brasil fundamenta-se no roubo. Com as desculpas de "fundos para a campanha" que absolve a "consciência" e engana os trouxas, rouba-se e rouba-se o dinheiro público aberta e acintosamente. E haja impostos, pago por todos, para aumentar o butim. Difícil uma mudança quando tudo aponta para a degradação. As raposas tomam conta do galinheiro e quem entra não tem opção, ou se locupleta ou está fora, com bastante risco. (Lembram do filme ´Sèrpico', sobre um policial que não era corrupto?).
Parece karma, mas o Brasil só piora.
Carlos X

Anônimo disse...

Bom dia ! Você tem certeza de que foi sonho? Eu acredito que tenha sido uma "visão". Você foi beneficiado pelo poder divino, com uma visão do inferno das negociatas, nas ruas quando a polícia recebe para não ver.
Nas cidades, quando políticos fazem força para não ver.
No Estado, como todos nós, conhecemos, hoje com a Descentralização.
No Brasil e no MUNDO, porque as notícias são colocadas diariamente.
Considero-me incluso...somos "neófitos" em matéria de sacanagem e enganação.

Anônimo disse...

É a dualidade da ética: a vigente na política é diferente da aceita na sociedade. A ética da política tem que ficar subjacente, não pode ser explicitada, ainda que todos nós saibamos, mais ou menos, como é que funciona. E afinal, na cabeça deles, se o corretor, o advogado e o arquiteto cobram seus 10%, porque nós políticos não podemos?

Anônimo disse...

Que coincidência! histórias parecidas me contaram dirigentes de federações esportivas - que preferem o anonimato - com relação do Fundesporte. Pedágio pago, projeto de captação aprovado.

Anônimo disse...

César,
O seu sonho deve ter sido muito longe de Florianópolis, de Santa Catarina e do Brasil !
Acho que foi no Japão, onde quando é flagrado, o corrupto se suicida !
Ou então em Israel, onde o primeiro ministro se auto cassa por ter sido constatada irregularidades nas contas eleitorais de 10 anos atrás !
Esses gringos são uns incopetentes que não têm a nossa "ginga" !