quarta-feira, 9 de julho de 2008

CASO METRÓPOLE: O RESUMO DA ÓPERA


Ontem, a convite do Sérgio Rubim (do CangaBlog), participei de uma entrevista com o Nei Silva, da extinta revista Metrópole. O encontro (foto acima) foi gravado em vídeo e será colocado nos blogs (dele e meu) nos próximos dias.



[Na foto, da esquerda para a direita: Canga (Sérgio Rubim), Nei Silva e este que vos fala]



Depois de ter conversado com o dono da revista e com a encarregada de fazer os contatos com o o governador e com os empresários (Márgara Hadlich, entrevistada aqui na edição do final de semana), já me arrisco a tentar fazer uma síntese que me ajude – e aos leitores, naturalmente – a entender melhor o caso.



Quando li o livro “A descentralização no banco dos réus” e estava escrevendo seu resumo, que publiquei aqui no dia 30 de maio, tive a clara impressão que ali estava uma obra feita para pressionar, para ameaçar. E usei o título “Retrato de uma chantagem” para identificar o assunto. Nada do que ficamos sabendo depois desmente essa impressão. Ao contrário.



1 Nei Silva e seu partner Danilo Gomes (cujo papel na revista, oficialmente, é de editor-chefe) buscam formas não convencionais de faturar com veículos de comunicação. No jargão publicitário esta atuação heterodoxa é, às vezes, classificada como “picaretagem”.



2 Prepararam um projeto sobre a Descentralização para “vender” ao governo do estado. Encontraram boa receptividade no então secretário do Planejamento, Armando Hess, que conhecia Danilo de Blumenau. Apresentaram o projeto em outubro de 2005. Receberam sinal verde em novembro.



3 O projeto não envolvia dinheiro público (pelo menos não diretamente). Munidos de cartinha de apresentação fornecida por Hess, eles iriam aos Secretários Regionais, que por sua vez indicariam os empresários que fossem fornecedores e parceiros do governo, que pagariam pelo projeto.



4 Seriam três edições da revista Metrópole, out-doors em várias cidades e um serviço que, à falta de nome melhor, está sendo chamado de “pesquisas de opinião”. Nei diz que era uma espécie de “feedback informal que a editora Metrópole levava ao governador LHS”. Isto foi orçado em R$ 500 mil.



5 A Metrópole não foi a única a fazer esquema semelhante (de ir atrás de patrocínio privado para colocar na rua produtos editoriais de apoio ao governo). A naturalidade com que secretários regionais e empresários atenderam Nei e Márgara demonstra que muitos não viam nada de errado naquelas transações.



6 Ia tudo às mil maravilhas. O nome do secretário Armando Hess era usado para abrir portas. Depois que Hess saiu do governo, em dezembro de 2005, Nei conta que usava o nome do próprio governador.



7 O deputado Elizeu Matos (PMDB) afirmou ontem (segundo relata Roberto Azevedo no seu blog), que quando era secretário regional de Lages, recebeu a visita de Nei (à noite retificou e disse que só falou com Márgara), com a conversa de que o secretário Armando Hess teria pedido apoio para o projeto. Diz que ligou para Hess e ele não confirmou o respaldo à história. E que aí não ajudou o empresário nos seus contatos na região.



8 O deputado contou o caso para mostrar que Nei era picareta (coisa sobre a qual não há muita dúvida). Mas Matos, assim como tantos outros no governo que tiveram contato com o “projeto”, não denunciou na hora a ação suspeita que teria detectado. E trouxe o fato a conhecimento público apenas ontem.



9 Aí veio o momento em que a história de bons negócios se transforma em pesadelo: junho de 2006. O comando da campanha de reeleição de LHS está preocupado com aquele sujeito que aborda empresários, potenciais doadores da campanha e parceiros do governo. Chamam Nei para conversar e fazem, segundo ele conta no livro e tem repetido nas entrevistas, a proposta fatítica: “deixa os empresários em paz que a gente dá um jeito de te pagar”.



10 Pronto, o que era uma operação de risco, onde o dinheiro grosso seria arrecadado de fornecedores do governo, passou a ser um contrato bancado pelo governo, ou pelo menos pelo PMDB. Afinal, a proposta teria sido feita em nome do partido. E, segundo Nei, os dois pagamentos que recebeu a seguir teriam, como origem, o caixa do PMDB.



11 Em agosto de 2006 os advogados do PP (e da coligação de Amin) entraram no TRE com o processo pedindo a cassação de LHS por abuso do poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação. Entre as provas, as duas edições da revista Metrópole (de janeiro e abril de 2006) e os out-doors expostos em janeiro. E a bomba explodiu no colo do Nei.



12 A partir daí, o relacionamento esfriou de vez. E a cobrança da dívida passou a ser uma missão impossível. Mesmo assim, com todas as pendências e com a ação contra LHS se arrastando, o secretário regional de Criciúma, Gentil da Luz, ainda contratou a editora Metrópole para fazer uma revista, “A força do Sul”, cujo foco eram o próprio secretário e Eduardo Moreira.



13 Quando viu esta revista, na reunião do colegiado de Gravatal, em setembro de 2007, Pavan teria dito: “isto vai dar merda”. O governador LHS mandou recolher e incinerar a revista. E Nei afirma que tinha recebido apenas 15% do que Gentil e Moreira lhe deviam.



14 Ao tentar cobrar na Celesc, recebeu a informação que deveria ir ao Centro Administrativo. No Centro Administrativo só queriam conversar sobre o outro projeto, não queriam misturar as dívidas. Aí, vendo que a coisa estava ficando complicada, Nei fez uma interpelação extra-judicial para cobrar a dívida do governo.



15 Foi neste momento, já no final de 2007, que o secretário Ivo Carminatti entrou no circuito, “para resolver o caso”. E convencer Nei a manter a cobrança em termos amigáveis. O ex-secretário Armando Hess também foi chamado a voltar ao ringue das negociações. As conversas, pelo que se depreende das gravações feitas pelo Nei, discutem valores, mas não questionam a dívida.



16 Nei afirma que recebeu parcelas mensais, em 2008. Por isso, nem desconfiou quando Hess o chamou para conversar num restaurante em Itapema e ficou de entregar mais uma parcela segunda-feira, em Florianópolis. Seria o pagamento de junho.



17 Na última semana de maio vários jornalistas, eu inclusive, receberam cópias do livro “A descentralização no banco dos réus”. Nei afirma que foi ele que mandou distribuir os exemplares. No dia 30 de maio publiquei um resumo do livro no meu blog e no dia 31 aqui nesta coluna, no DIARINHO.



18 Com a divulgação da “obra”, Armando Hess ficou preocupado e buscou aconselhamento no Centro Administrativo. Ali foi montada a estratégia que seria seguida nas horas seguintes e culminaria com a prisão, em flagrante, na segunda-feira, do Nei Silva por extorsão.



19 Quase uma dezena de agentes do DEIC acompanharam, em Itapema, o jantar em que Hess e Nei conversaram por quase duas horas. A idéia, ao que parece, era fazer a prisão ali mesmo. Mas, por algum motivo, foi transferida para segunda-feira, em Florianópolis.



20 Os debates acalorados ontem, na Assembléia, davam bem a idéia de como este assunto tem mobilizado um e outro lado. Pra apimentar a semana, as bancadas do PT e do PP convidaram Nei Silva para ir à Assembléia hoje (às 9:30h), para uma “conversa informal”. Deve repetir, ao vivo, basicamente o que está no livro. O que não é pouca coisa.

8 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom o resumão. Mas estou com uma dúvida: O MPE não foi provocado? O que eles estão fazendo de tão importante que até o momento não se pronunciaram? Estão "esperando" o momento certo da mesma forma que o secretário Carminatti "esperou" ?
Reparastes que neste rolo todo, que se arrasta (termo que o exmo gov. adora), os protagonistas agem como se não houvesse mais ninguém interessado, tipo eleitores, justiça estadual, federal, etc. ?

Anônimo disse...

Acabei de ver o discurso do dep. herneus de nadal (reprise). Ele disse que a imprensa séria dá a oportunidade igual às partes se defenderem. Alguém poderia perguntar ao deputado quem não está dando chance do governo se defender? Não foram os deputados da base governistas que rejeitaram a convocação do secretário carminatti?
Foi a você, Cesar, ao Damião ou ao Canga que o deputado se referia como os que não são sérios (por exclusão)? Porque pelo que tenho visto só vocês, os três mosqueteiros, que estão correndo atrás, investigando e noticiando. O espaço dado ao nei está desproporcional ao espaço dado ao governador, ao carminatti ou aos envolvidos do governo. Vocês estão dando chance ao governo se defender?

Anônimo disse...

César,

Quanto o Nei recebeu dos empresários, valor e data?

Quanto recebeu do PMDB, valor e data?

Anônimo disse...

Minha opinião, pra que fique registrada. Vai sair por "baixo do pano" um enorme acordo e fica o dito pelo não dito.

Cesar Valente disse...

Pois é, 12:48, também ouvi o discurso do Herneus, ontem. Acho que a questão vale um post. Mas à tarde, que agora vou na Assembléia tentar conferir, com o Nei, a lista de pagamentos que o 6:25 perguntou.

Anônimo disse...

César, que belo resumão. A começar pela foto, onde dois "foquinhas" foram flagrados de bloquinho e caneta na mão.
Acredito que o fato da revista ser uma picaretagem, não muda nada em relação ao envolvimento do governo. Ao contrário, pois utilizar uma revista do gênero é mais um ato falho. aliás, oportunismo mútuo.
Nesse caso a picaretagem não interessa mais. O que está em jogo é:
1)o abuso de poder econômico e o uso indevido dos meios de comunicação (devidamente tratado no TSE);
2)a comprovada relação governo-revista;
3)o conhecimento e apoio tácito de LHS ao "projeto";
4) a dívida com a revista;
5) a montagem da suposta "extorsão";
6) advogado pago pelo Estado para defender a cúpula;
7) proibir a circulação do livro;
8) o dinheiro usado para pagamento (de onde? contabilizado? quente ou frio?);
9) não foi só com a Metrópole pois outras publicações tiveram envolvimento semelhante ou pior;
10) governantes fogem do assunto, não argumentam e, assim, assumem a culpa.
Em suma, quem é mais picareta nessa história?

Anônimo disse...

César,

Excelente trabalho jornalístico. Mais do que parabéns, porque sua ação ultrapassa a esfera da simples informação. É um ato de resistência, furando o bloqueio dos interesses político/econômicos, que caracterizam a gestão pública no Brasil. Santa Catarina entrou nessa dimensão “alagoana” de lidar com a coisa pública, com a imprensa de rabo preso contorcendo-se para dar conta dos dilemas de informar e faturar. Você e seus amigos trazem luz à essa turva realidade. Os poderosos vão ter que aturar. Ave, César!

Carlos X

Anônimo disse...

Não tenho nada contra poderosos ou humildes.A questão que se coloca é a da busca da verdade, podendo aparecer em qualquer situação,em qualquer lado. A responsabilidade de um repórter/jornalista/cidadão é com a verdade e não pró-x ou pró-y.As pessoas que buscam ver o circo pegar fogo,queimam sua consciência, pois não tem interesse na verdade