O BEBUM E A LEI

Tem gente que acha que, sempre que uma lei não está sendo cumprida, ou não está produzindo os efeitos desejados, basta fazer uma outra lei, mais rigorosa, que automaticamente tudo entra nos eixos.

Fazer com que motoristas não dirijam alcoolizados, nem falando ao telefone celular, ou mesmo dormindo, é uma tarefa difícil, complicada, à qual o poder público, em vários países sérios do mundo, tem se dedicado há décadas. A forma de cada um portar-se não é determinada apenas pela existência de alguma lei. Mas, principalmente, por uma convenção socialmente aceita. E, em alguns casos, pelas punições que sejam efetivamente aplicadas.

Parece razoável que, primeiro, os brasileiros, de uma maneira geral, se convençam que é perigoso dirigir bêbado. Assim como precisam estar seguros que não se deve ultrapassar sem visibilidade. Nem correr acima da capacidade do veículo ou da estrada. Somos lenientes e omissos diante de gente arrogante que não respeita as leis.

Essa mudança cultural não acontece da noite para o dia. É um programa de longo prazo, que precisa estar presente da pré-escola até a universidade. Mas o fato é que não temos, há muito tempo, qualquer programa sério e abrangente de prevenção de acidentes. Ou de educação para o trânsito.

E não temos tradição fiscalizadora (nem experiência, nem recursos) para implantar uma lei seca. Ainda que parcial. Mas temos expertise em mercado negro, crimes diversos e pirataria. Esses “empreendedores” certamente saberão tirar bom proveito de mais essa oportunidade.

A entrada em vigor da lei que proíbe venda de bebidas alcoólicas próximo a rodovias federais, em outro contexto, talvez até pudesse fazer algum sentido. No momento atual, parece apenas uma confissão arrevezada de incompetência: como não consegue educar os motoristas nem reduzir a sanha assassina com que enfiam o pé no acelerador, o governo resolveu informar à patuléia que a culpa é do excesso de oferta de bebidas alcoólicas.

Esse excesso e essa liberalidade, na verdade, causam problemas não só nas estradas. Mas a lei não faz parte de uma preocupação ampla com a saúde pública e a qualidade de vida. Mais parece jogada de marketing, para reduzir a pressão sobre as condições das estradas e mudar o foco da discussão.

As fotos mostram policiais rodoviários federais em hipermercados de Brasília, fazendo algo que claramente foge da sua especialidade principal: autuar estabelecimentos comerciais e mandar recolher estoques de bebidas aos depósitos. Como se obrigar o bebum a se abastecer num supermercado do centro, antes de pegar a estrada, fosse, de fato, impedi-lo de beber.

Resta saber se esses policiais, agora transformados em fiscais da lei seca, atentos às prateleiras e geladeiras, não farão falta na já escassa patrulha das estradas.