quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

ESTRATÉGIA INACEITÁVEL

O jornal Folha de S.Paulo publicou uma reportagem mostrando o império econômico que os bispos da Igreja Universal possuem. São inúmeras empresas (a mais visível delas, a rede Record de televisão), muitos bens, enfim, um conglomerado poderoso.

Os bispos não gostaram da exposição e resolveram retaliar. Até agora, são 96 processos de fiéis: 56 contra a Folha e a jornalista Elvira Lobato; 35 ações contra o jornal A Tarde, de Salvador, e o repórter Valmar Hupsel; e cinco ações contra jornal Extra, do Rio, e seu diretor de redação, Bruno Thys. O próximo alvo é o jornal O Globo.

E, em nota, a Igreja Universal diz que não está orquestrando as ações, mas avisa que tem “cinco milhões de seguidores”. Um exército e tanto que, ao que parece, está sendo chamado a ir para os campos de batalha, para impedir que mais informações sobre os bens terrenos da Igreja sejam divulgadas.

O assunto é tão grave que resolvi ceder boa parte da coluna de hoje para transcrever, na íntegra, a nota oficial da Federação Nacional dos Jornalistas. Ali a situação está explicada com clareza. É, de fato, uma das ameaças mais concretas à liberdade de opinião.

NOTA OFICIAL
Jornalistas repudiam intimidação da Universal

A Federação Nacional dos Jornalistas, o Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro, o Sindicato dos Jornalistas da Bahia e demais Sindicatos do país filiados à FENAJ repudiam, com veemência, a atitude da direção da Igreja Universal do Reino de Deus, que desencadeia campanha de intimidação contra jornalistas no exercício da profissão.

Também apelam aos Tribunais e ao Superior Tribunal de Justiça no sentido de alertá-los para ações que se multiplicam a fim de inibir o trabalho de jornalistas em todo o país. O acesso e a divulgação da informação garantem o sistema democrático, são direitos do cidadão, e o cerceamento de ambos constitui violação dos direitos humanos.

A TV Record, controlada pela Universal, chegou ao extremo, inadmissível, de estampar no domingo, em cadeia nacional, a foto da jornalista Elvira Lobato, autora de uma matéria sobre a evolução patrimonial da Igreja, publicada na Folha de S.Paulo. Por esse motivo, Elvira responde a dezenas de ações propostas por fiéis e bispos em vários estados brasileiros.

Trata-se de uma clara incitação à intolerância e do uso de um meio de comunicação social de modo frontalmente contrário aos princípios democráticos, ao debate civilizado e construtivo entre posições divergentes.

O fato de expor a imagem da profissional em rede nacional de televisão, apontando-a como vilã no relacionamento com os fiéis, transfere para a Igreja a responsabilidade pela garantia da integridade moral e física da jornalista.

A Federação Nacional dos Jornalistas, o Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro, o Sindicato dos Jornalistas da Bahia e demais Sindicatos exigem que os responsáveis pela Igreja Universal intervenham para impedir qualquer tipo de manifestação de intolerância contra a jornalista.

O episódio nos remete à perseguição religiosa, absurda e violenta, praticada por extremistas contra o escritor Salman Rushdie, autor de Versos Satânicos, e as charges de Maomé publicadas no jornal dinamarquês Jyllands-Posten.

O jornalista Bruno Thys do jornal carioca Extra também é processado pela Universal em cinco cidades do Estado do Rio de Janeiro. O repórter Valmar Hupsel Filho, na capital baiana, já responde a pelo menos 36 ações ajuizadas em vários estados do Brasil, nenhuma delas em Salvador, sede do jornal A Tarde, onde trabalha.

Há evidência de que essas ações, com termos idênticos, estão sendo elaboradas de forma centralizada, distribuídas e depois impetradas em locais distantes, para dificultar e prejudicar a defesa, além de aumentar o custo com as viagens dos jornalistas ou seus representantes.

Encaminhados à Justiça com o nítido objetivo de intimidar jornalistas, em particular, e a imprensa, em geral, esses processos intranqüilizam e desestabilizam emocionalmente a vida dos profissionais e de seus familiares. Ao mesmo tempo, atentam claramente contra os princípios básicos da liberdade de expressão e manifestação do pensamento.

Em um ambiente democrático e laico, é preciso compreender e aceitar posições antagônicas e, mais ainda, absorver as críticas contundentes, sem estimular reações de revanche ou mesmo de pura perseguição.

Este episódio repete, com suas consideráveis diferenças, outras situações em que os meios de comunicação exorbitaram os fins para os quais foram criados. A Federação Nacional dos Jornalistas, o Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro, o Sindicato dos Jornalistas da Bahia e demais Sindicatos sustentam que a imprensa não pode se confundir com partidos políticos, crenças religiosas ou visões particulares de mundo.

Brasília, 20 de fevereiro de 2008.
Federação Nacional dos Jornalistas
Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro
Sindicato dos Jornalistas da Bahia.

4 comentários:

Anônimo disse...

E o Presidente da Repúplica - de olho nos votos dos fiéis - já emitiu sua opinião: é favorável as ações....

Anônimo disse...

bom... mas lembrem-se tbm como esses jornalões vem tratando dessas igrejas... tem mutio preconceito embutido nas manchetes... chamar uma igreja de Seita, é desmerec´^e-la... então, nenhuma dessas ações está por ai a toa...

Cesar Valente disse...

Felipe: se a Igreja tivesse mesmo se sentido ofendida, poderia ter entrado com uma ação contra o jornal. A estratégia condenável é entrar com 30 pequenas ações nos mais distantes lugares, onde o jornal não chega nem nunca chegou (como é o caso do A tarde, da Bahia). Tanto que os juízes não só não estão aceitando, como pelo menos dois deles já condenaram os postulantes por litigância de má fé.
É claro que as ações não estão à toa: estão servindo a uma pressão orquestrada e inaceitável, para que tenhamos medo até de falar no nome do bispo Macedo. Quanto mais nos seus bens ou da igreja que ele fundou.

Anônimo disse...

Não faço defesa do bispo Edir... sei q ele é um baita sacana tbm... mas o preconceito está embutido, vc não concorda? alias, nem sou evangélico nem nada. Mas quase a totalidade das reportagens q tratam da Igreja universal são negativas, e ainda assim, ela cresce um bocado...

ainda assim, a tática dos múltiplos processos é sim uma orquestração abusiva e uma tática desleal. Mas, como disse, é até uma merecida resposta a maneira desleal como essa religião tbm vem sendo tratada.