CONTAGEM REGRESSIVA
Pronto. Passado o Natal começa a preparação para o feriado seguinte, menos família, mas não menos complicado. O potencial de despertar a depressão que jaz adormecida embaixo de algum daqueles baús que temos no sótão é tão grande no reveióm quanto no Natal. As minhocas da alma agitam-se quando a gente pensa em ano novo, “fazer coisas que não fez, fazer melhor o que ficou mal feito, fazer de novo as coisas boas”.
E alguns de nós, como eu, tornam-se, no final do ano, chatos filosofais e começam compulsivamente a escrever como é que as coisas devem ser e de que forma tudo poderia acontecer para que, no fim, tudo acabe bem. E alguns de nós, como eu, sabemos exata e precisamente tudo de tudo.
Ora, não existem coisas absolutas e nada é nem o que parece. Ou nem isso. Muito pelo contrário. Somos todos os dias enganados a todo momento. O amarelo na TV ou na tela do computador é uma mentira. Peguem uma lente de aumento e vejam vocês mesmos e mesmas. São três luzinhas: a vermelha, a verde e a azul que acendem e apagam. Elas nos iludem fazendo-nos “ver” todas as cores (“16 milhões de cores”, falam os manuais).
No cinema, somos igualmente expostos ao ridículo, quando acreditamos que as pessoas se movem. Não existe movimento no cinema, são imagens paradas, projetadas uma depois da outra num ritmo hipnótico que nos faz acreditar que o Hugh Grant atravessou todas as estações do ano indo do início ao final da feira em Nothing Hill.
Nos jornais e revistas a empulhação continua. O verde é mentira. Peguem novamente a lupa: só existem pontinhos amarelos, cianos (um azul envergonhado), magentas (um vermelho enferrujado) e pretos. Eles se aproximam e afastam com o único propósito de deixar-nos, feito tolos, postados diante de uma página dupla da Playboy, acreditando que vimos todas as cores da amazônia. Aquele matagal a perder de vista...
Idiotas, todos nós, que achamos que sabemos tudo, que temos tantas certezas, que afirmamos com convicção porque estávamos lá e vimos. Tolos que se esquecem a todo momento de como os sentidos nos enganam, como os sentimentos enevoam os sentidos e como somos limitados para lidar com o mundo exterior.
Em 2006 eu queria, apenas, melhorar um pouco mais a minha percepção. E emocionar-me mais. Só. Ou não.
NA ESTRADA COM O TIO CESAR
Rumo Sul, na buraqueira da BR-101
Vocês estão convidados para me acompanhar nesta pequena aventura: fugir de Florianópolis nesta semana de festas. Para onde? ora, para o Uruguai e a Argentina, que devem ter menos uruguaios e argentinos que Canasvieiras. Vamos de ônibus, sem gastar muito.
A ESTRADA
Ao embarcar na rodoviária Rita Maria, leve seu próprio relógio. Todos os aeroportos, estações de trem, rodoviárias, colocam vários relógios à disposição do público, para que ninguém perca o horário. Menos a Rita Maria.
Os ônibus interestaduais são muito bons, melhoraram muito nos últimos anos, mas as estradas continuam as mesmas: buraco dentro de buraco.
Em todo o trecho ainda não duplicado da BR 101 a gente vê maiores ou menores indícios que estão começando a trabalhar na segunda pista. Algumas empreiteiras trabalham de verdade, outras parece que só estão fazendo de conta.
O OTIMISTA
Nas sete horas em que dura a viagem de Florianópolis a Porto Alegre (num direto-executivo, de dia), lá no andar de cima, dá pra ver a paisagem, assistir filmes e, no silêncio da cabine (o motor fica lá longe, perto do chão), se pode ouvir também a conversa dos vizinhos.
Um deles, daqueles que gostam de falar alto e bastante, nos permitiu ficar sabendo praticamente de toda a vida dele e da família.
E era um otimista: assim que sentou, na primeira fila, diante daquele janelão do segundo andar, já falou: “o pessoal desta fila é o primeiro a morrer numa batida, isso aqui é muito perigoso”.
E foi animando sua vizinha de poltrona: “eu prefiro o avião, porque pelo menos, quando tem um acidente, a gente não fica aleijado, morre tudo de uma vez”. E pra tudo ele só pensava o pior “parece que vai cair um temporal”.
Depois de três horas ele foi lá pra trás, começar de novo, com uma nova platéia, que ainda não sabia que ele odeia Porto Alegre, embora tenha nascido lá e que adora Florianópolis.
FREE-WAY
A estrada entre Osório e Porto Alegre (na foto acima) tem pedágio e é uma estrada-modelo há várias décadas. Três pistas pra lá e três pistas pra cá. Uma beleza, exceto pelo fato de que tem muito remendo mal feito no asfalto, principalmente na pista onde os caminhões e ônibus circulam. Pra mim, que esperava um tapete macio, depois da buraqueira, foi uma decepção. Quando a gente paga pedágio espera que pelo menos os remendos sejam bem feitos.
O pior é que os gaúchos têm razão, o por-do-sol em Porto Alegre é mesmo muito bonito.
AMANHÃ: O ÔNIBUS MAIS BARULHENTO DO MUNDO E, FINALMENTE, MONTEVIDEO.
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