quinta-feira, 27 de abril de 2006

QUINTA

MAU EXEMPLO
Antes de dizer qualquer coisa sobre o que levou os professores estaduais a decidir pela greve (coisa que farei mais abaixo), é preciso lamentar a forma estúpida como resolveram, em resposta ao governo, punir a população da capital. Como se todos os pobres coitados que sofrem tanto quanto os professores estaduais tivessem culpa.

Ao fechar o trânsito, impondo à população um sofrimento adicional inaceitável, as lideranças dos professores mostram que não têm noção de como se constrói um movimento social vitorioso. Não tem como obter a solidariedade dos habitantes da capital azedando-lhes o dia. Fazendo com que tenham que sofrer horas intermináveis nos pontos de ônibus ou dentro dos coletivos lotados.

GOVERNO INSENSÍVEL
O governo LHS/Dr. Moreira, desde seu primeiro ano, tem tido, com os servidores (e com os professores em especial), uma relação complicada, que exigiu, sempre, grande cuidado e atenção. Os abonos, que apagaram algumas fogueiras e evitaram várias greves são, por sua natureza, benefícios que precisam fazer parte de algum projeto mais amplo, que especifique prazos, porque não devem ser permanentes.

Até eu, que sou distraído, sabia que num ano eleitoral os sindicatos (que são entes geridos politicamente, como todos sabem), tratariam de reforçar sua atuação. Caberia aos agentes políticos do governo anteciparem-se a essa pressão anunciada e colocar em prática algum plano minimamente eficiente.

Apostar no esvaziamento da greve depois dela ser deflagrada e desqualificar as lideranças sindicais é sempre a pior saída. O melhor seria atuar com habilidade e sensibilidade desde o começo do ano, para mostrar aos professores (e à sociedade que, afinal, quer educação de qualidade em troca dos impostos que paga), uma clara preocupação com a organização da carreira e a justa remuneração.

Valorizar o professor não é pouca coisa e exige talento administrativo, interesse e vontade política.

MAL NA FOTO
Vocês acompanharam aqui nesta coluna e quem quis acompanhou pelo site de notícias do governo, a festa enorme que foi feita com os tais uniformes, com o material escolar, com os ginásios de esporte, com a pintura espalhafatosa das escolas.

Fotos e mais fotos celebram esses momentos lindos. Mas ao que parece, pelo que a gente ouve o sindicato dos professores dizer, ao mesmo tempo em que enchia de vermelho e verde a vida escolar, o governo não mostrava, aos professores e à comunidade, que sabia o que estava fazendo.

Uma greve na escola traz prejuízos primeiro para os alunos, depois para os pais dos alunos, depois para toda a comunidade. O governo nem precisa se preocupar: todos os candidatos que ele deseja ver eleitos se elegerão (e ainda prometerão resolver o problema educacional no ano que vem). As greves de professores não abalam o governo. E os dirigentes sindicais terão seus minutos preciosos de televisão e palanque, projetando suas próprias carreiras.

Como sempre, só os contribuintes e seus filhos ficarão mal na foto.

A CAPITAL ENFERRUJADA
O bom começo que foi a construção da monumental Ponte da Independência, consolidando Florianópolis como capital do estado, não foi seguido, décadas depois, por outros gestos e empreendimentos à altura daquela ousada demonstração de coragem.

Denominada, com justiça, de Hercílio Luz para homenagear seu idealizador, a ponte contém uma visão de utilização da cidade e da ilha que de alguma forma se perdeu no tempo.

Sua altura, que permite a passagem de navios, mantém íntegro o mar interior, não atrapalha o acesso marítimo aos vários pontos da Ilha e do continente por embarcações de todo tipo.

Seu projeto imponente integrou-se com naturalidade ao ambiente de uma cidade que, muitos anos depois, parece ter medo da beleza e um certo apreço pela feiúra e pela falta de charme de seus equipamentos urbanos.

A situação da ponte, que no começo de maio completa 80 anos, é uma triste alegoria da situação da capital: emperrada, enferrujada, com o futuro incerto, ameaçada de colapso a qualquer momento.

A CAPITAL SEM RUMO
Aqueles que têm a responsabilidade de preparar a cidade para que ela seja habitável daqui a 30 anos não pensam em nada que não sejam vinganças pessoais, picuinhas, disputas de território, demonstrações de força paroquial e em arrumar seu próprio futuro.

Não se planeja com profissionalismo o uso democrático, adequado e alegre do pequeno espaço que a Ilha dispõe. Não se pensa nem mesmo em coisas vitais, como o abastecimento de água potável.

Mas as sessões da Câmara de Vereadores, não raro, são palco de debates acirrados e apaixonados. Quem vê de longe até pensa que estão em debate questões fundamentais. Mas se olhar de perto e por baixo dos panos, vê-se que o horizonte da discussão, o mais das vezes, termina logo ali, a poucos metros, no lodo onde está o desafeto que é preciso prejudicar, ou o aliado que espera algum benefício.

A CAPITAL DO DESÂNIMO
Não deixa de ser irônico que justamente na época em que o centro da cidade e algumas áreas nobres estão bem cuidadas, em que os canteiros têm flores, as ruas têm asfalto novo, comecem a surgir tantos e tão graves problemas estruturais.

Viver bem em uma cidade não é só encontrar, em algumas áreas, as ruas bem varridas, as calçadas limpas e os jardins bem cuidados. Isso conta, mas é apenas uma maquiagem. Torna o rosto mais agradável, mas não sustenta uma conversa, não mantém uma relação.

Esgoto, transporte público, saúde, segurança, acesso público aos bens comuns (praia, montanha, parques, lagoas), cultura, alegria e prazer são algumas das coisas a que os habitantes de uma cidade como Florianópolis têm direito e cada vez mais exigem.

Não sei vocês, mas eu não tenho encontrado quem esteja animado com a cidade, com o que está sendo feito dela. As obras em andamento são pífias, destituídas de visão de longo prazo, o uso do espaço urbano será cada vez mais predatório. Uma nuvem escura encobre o sol e esfria nossas almas.

3 comentários:

Anônimo disse...

É por aí Cesar. Parabens pelo artigo. Infelizmente os especuladores da ilha e os administradoes (passados e presentes) parece que nunca se deram conta que Florianópolis está em ilha no mar. E por isso tem limitações sérias de recursos, espaço e de acessos.

Anônimo disse...

Sensacional, César. Sensacional e desesperador, já que aponta vários problemas, mas não sugere as suas soluções. Quais seriam as estas soluções? Como devemos nos organizar para garantir o futuro de nossa cidade? A quem podemos confiar esta tarefa hercúlea?

Anônimo disse...

César, o tal FloripAmanhã faz realmente alguma coisa a respeito da cidade? A sociedade civil precisa se organizar de verdade.