terça-feira, 24 de julho de 2007

Terça


BRASIL X ARGENTINA
Tá empatado, o jogo do descaso e da crise aérea. Segundo o influente The Washington Post, a bagunça que existe no controle do tráfego aéreo é semelhante nos dois países.

Na Argentina, o único grande radar de controle aéreo pifou e está desativado há meses. O governo fala em pedir um emprestado da Espanha, até conseguir resolver o caso, “ainda este ano”. Os controladores argentinos, tal como os brasileiros, queixam-se de trabalhar em condições que aumentam o perigo para quem voa (e, naturalmente, também para quem está embaixo, que pode, a qualquer momento, receber um avião na cabeça).

No Brasil, a ratalhada instalada no governo ri e se regozija. A TV Globo mostrou o assessor direto de Lula comemorando o defeito no reverso e a Veja mostrou os chefes da Infraero em Congonhas, olhando para o fogo e rindo a bandeiras despregadas.

Entidades internacionais já falam que o Brasil deveria aceitar ajuda externa para resolver o caso. Países sérios, como a Suíça, quando tiveram problemas de controle aéreo, pediram ajuda internacional. Uma intervenção estrangeira idependente evita que as pressões políticas locais possam atrapalhar a tomada de decisões. Mas, no Brasil, onde até agora nada se fez além de falar, dificilmente se fará alguma coisa.

ERA UMA VEZ...

Os jovens, ao ver tanta confusão e incompetência no gerenciamento da infraestrutura aérea brasileira podem achar que sempre foi assim. Não foi.

Permitam-me tomar o tempo de vocês e o precioso espaço deste jornal para reunir algumas reminiscências aéreas. Convido-os a viajar comigo no tempo. Não sou especialista em aviação, mas gosto muito de “andar” de avião. E não gostaria que vocês pensassem que avião é mais perigoso que outros meios de transporte.

ALGODÃO E CHICLETES

Passei meus dez primeiros anos de vida em Tubarão, no sul do estado. De 1953 a 1963. Lá, em alguns fins de semana, meu pai me levava ao “campo de aviação”, um campo de pouso com algumas construções simples. Num hangar, conheci o teco-teco (um pequeno avião monomotor) do seu Pacheco. Um piloto local que, como qualquer piloto de aeroclube em qualquer país do mundo, não se separava dos seus óculos rayban verde-escuros, com armação de metal e uma jaqueta de couro com gola de pele.

E era lá também que ia levar e buscar minha mãe, funcionária pública federal, que de vez em quando tinha que ir a Florianópolis. Ela ia de avião, usando as linhas regulares da Transportes Aéreos Catarinenses (TAC), a bordo de um Douglas DC3. De avião era possível ir às principais cidades catarinenses. Mesmo à longínqua Chapecó.

Foi num DC3 que fiz minha primeira viagem. Para Florianópolis. Esse avião tinha dois motores muito barulhentos. Logo que a gente entrava, recebia umas caixinhas com chicletes (rezava a lenda de então que mastigar ajudaria a evitar os problemas de altitude nos ouvidos) e algodões, para reduzir um pouco o ruído. No mais, o interior não parecia em nada com o dos aviões que vieram depois.

E, um outro problema sério: o DC3 não tinha a cabine pressurizada e voava relativamente baixo. Não conseguia escapar das turbulências, que o faziam chacoalhar como um jipe numa estrada esburacada. Os saquinhos para enjôo eram usados com freqüência.

Mas, mesmo com toda essa precariedade, o serviço funcionava muito bem. Durante todo o tempo que moramos em Tubarão, meu pai recebia, todos os dias, o jornal O Globo, que vinha do Rio de avião. E, toda semana, o Pato Donald e a revista O Cruzeiro também chegavam com pontualidade àquela cidadezinha que gostava de ser chamada de Cidade Azul.


VARIG, VARIG, VARIG

A empresa, que cresceu de uma maneira até hoje mal explicada, recebendo linhas retiradas da Panair do Brasil, cujo final também nunca ficou bem explicado (não faliu, foi fechada pelo governo), era, no seu período áureo, uma das melhores do mundo.

Quando morei em Brasília, no começo da década de 80, descobri um vôo para o Rio (e do Rio), que era feito com um Boeing 707 (usado nas rotas internacionais). Tinha o mesmo serviço dos vôos internacionais (diziam que aquele vôo era usado para treinar as tripulações de cabine), com talheres de metal, guardanapos engomados, bebidas de primeira e comida espetacular.

Mas, tal como anos depois aconteceu com a TAM, a Varig foi perdendo eficiência, o cliente deixou de ser paparicado, os funcionários não escondiam seu mau-humor. Era famosa a constatação, entre viajantes internacionais: nos vôos da Varig que saiam do país, as aeromoças e aeromoços tratavam a gente com frieza, mas com correção. Nos vôos de volta só faltavam jogar as bandejas no colo dos passageiros. E ai de quem resolvesse reclamar.

SAUDADES DO ROLIM
Acompanhei muito de perto o crescimento da TAM. Morava em São Paulo e encheu-nos a todos de ânimo e alegria ver o entusiasmo com que o Comandante Rolim ia encontrando brechas, no fechado mercado aéreo de então, driblando, com seu carisma e seu talento de marqueteiro, a Varig, a Transbrasil e a Vasp.

De manhã cedo, ele ia pessoalmente à sala de embarque, cumprimentar seus passageiros. Ficava na porta do avião desejando boa viagem. Mandou colocar poltronas de couro nos Fokker 100, que vieram substituir os turbo-hélices (Fokker 50) com que começou a expandir seus negócios. A gente sabia que, se reclamasse para o Comandante Rolim, ele ia dar um jeito de consertar o que nos incomodava. Era uma época em que a empresa lutava para se afirmar e conquistar clientes e em geral eramos todos muito bem tratados.

Mas aí a Fokker faliu (em março de 1996), a TAM cresceu, o Rolim morreu (em julho de 2001) e os novos executivos revelaram-se uns idiotas da objetividade, como dizia Nelson Rodrigues. E tudo o que a TAM conquistou em termos de fidelidade e apreço, foi pelo ralo. E continua indo.

Se eu fosse acionista da TAM, trataria de encontrar, rápido, um substituto para o Bolonhesa aquele.

PONTE AÉREA
Durante quase todo o tempo em que trabalhei na Gazeta Mercantil, em São Paulo e em Brasília, viajei muito de avião. Foram uns cinco anos com vôos quase semanais. Os mais freqüentes, para Florianópolis, claro.

Dava para marcar reuniões, para se programar, para organizar a vida, usando o avião: ninguém esperava que os aviões atrasassem. Ao contrário, o normal era que eles funcionassem direito.

Claro que aconteciam problemas e atrasos, mas eram, de fato, ocasionais, nada parecido com o que se vê hoje, quando todos perderam completamente a confiança no transporte aéreo.

8 comentários:

Anônimo disse...

Cesar,

Houve uma crise internacional no setor aereo.

Empresas como a Pan Am, Suisser e outras, até então seriam inimagináveis que fossem falir.

A causa, os Consultores do setor tem diversas.

Na Varig, imputam as mordomias de seus funcionários através de um Fundo de Pensão pra la de dadivoso, como o grande responsável.

O crescimento de pequenas empresas com menor custo operacional e com a consequente tarifa com menor preço foi outra causa para a quebra dessas grandes e desglamurização do setor.

Os talheres de prata, os guarda-napos de linho, os drinques em copos de cristal, não mais existem.

No fim dos anos 60 uma passagem aerea de classe turistica para Londres custavam perto de quatro mil dolares. Hoje menos de mil.

Os tempos são outros. As Cias aereas tambem. Os passageiros idem.

A única coisa que continua igual é a infra estrutura áerea, cujo governo é o responsável.

Abs.

Pedro de Souza

Anônimo disse...

Caro Cesar...
Não discuto a substância de teu texto (se assim fosse haveria toneladas de blogs "alinhados com o poder" para meu deleite) era apenas uma questão de forma. Neste "poste" (Brasil X Argentina) aqui, sinto-me muito mais confortável, mais instigado a debater a coisa. Aliás, o que achas desta hermana opinião: http://www.pagina12.com.ar/diario/elmundo/4-88610-2007-07-24.html
????
A tua resposta serviu-me como lenitivo e se em algum momento fui ofensivo perdo-o-te...rsrsrs...não era assim que me pretendia entendido. Governos, empresários, burocracias não podem ser nossos torniquetes, jamais. Apenas a lucidez, o conhecimento, a informação podem guiar-nos. Daí meu zelo. Saudações !!!

Anônimo disse...

O problema maior do setor aéreo é sem dúvida a falta de gestão:
1- A Varig teve seu período de crescimento e chegou a ser uma referência mundial enquanto foi dirigida por Rubem Berta, o primeiro empregado da empresa. Quando ele achou que, pela experiência própria, ninguem haveria de dirigir melhor a empresa que seus próprios empregados, não previu o corporativismo, e profissionais do porte de Ozires Silva e Fernando Pinto foram demitidos ao proporem reestruturação da empresa depois do ataque às Torres Gêmeas.
2- A VASP foi comprada por um caminhoneiro, a Transbrasil teve ingerência política e TAM trocou o Comandante Rolim por um banqueiro.
3- A ANAC é um cabide de emprego de políticos incopetentes indicados por José Dirceu.
O resultado está aí !

Anônimo disse...

A causa do fim da Panair já é conhecido e está no livro "O Pouso Forçado": Não colaborou com a revolução de 64.
Mas um dia alguém haverá de contar o que levou ao fim da Varig sem qualquer atitude do governo e como uma empresa criada em 2001 se tornou a 2ª maior do Brasil em apenas 5 anos !
Alguém haverá de contar também, por que a Gol deixou de adquirir a Varig no leilão e, "para atender ao pedido do amigo Presidente da República" (e amigo do Roriz)comprou a mesma Varig por 5 vezes o valor do leilão !

Anônimo disse...

PS: "Perdo-o-te: Perdôo-te"

Anônimo disse...

Caro Cesar,
Entre todo esse furdunço e caos que o Brasil vive, o retrato mais fiel de como os políticos e, em especial, os petistas, tratam os seus eleitores e cidadãos brasileiros, foi a condecoração com a medalha Santos Dumont para pessoas destacadas na aviação brasileira. Essa foi, na minha opinião, a maior ofensa que nós poderíamos aguentar. Acontece o maior acidente aéreo brasileiro e dois dias depois o presidente da ANAC é premiado. Meu Deus!

Bion disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

César, cadê a coluna de quarta-feira? Perdeu a hora, professor? :))

Marcelo Santos